26 de jan. de 2011

Memórias de uma suicída.

O vento batia em meu corpo e me empurrava contra a direção que eu almejava seguir. Ele era forte, frio, violento. Ardia em minha pele, como se uma pequena malha de brasas me agasalhasse. E por mais que eu quisesse sentir o calor das brasas, a dor prevalecia. A dor era tudo e mais um pouco. Ela exercia controle de cada parte do meu corpo, emitindo enormes ondas de choque elétrico, me fazendo tremer e olhar sempre pra baixo.
Pra baixo. Era pra lá que eu queria ir. Deixaria a imensidão negra da noite me engolir. Dominar cada centímetro do meu corpo, fazer o que bem entender com ele. A altura era assustadora para qualquer individuo que se encontrasse no meu lugar. Qualquer um, menos eu. Sempre fui fã de alturas. Adoro aventuras, e essa seria uma maravilhosa para fechar meu livro chamado Vida com chave de ouro.
Meus cabelos longos e dourados flutuavam no ar, dançando agitadamente no ritmo do vento. Olhei pras minhas brancas e gélidas mãos, elas tremiam e soavam exageradamente. Tentei enxugá-las na calça jeans apertada que eu escolhera pra descansar. Calça jeans escura e apertada, blusa de manga branca, jaqueta de couro preta e coturnos combinando com a jaqueta. Observei mais uma vez minha aparência. Meu corpo já estava debilitado, tão magro como nunca fora. Podia lembrar-me de quando o olhei nu pela última vez, horas antes. Tão pálido, magro, apenas a pele sobre o osso, passando uma imagem de doente, morta-viva. Mais morta do que viva. Sorri da minha ironia. Viva. Isso parecia engraçado, talvez porque não seria assim por tanto tempo.
Dei mais um passo a frente e senti algumas gotas geladas caírem sobre meu corpo. Poucos segundos depois a blusa branca já estava transparente, grudada em meu corpo. Meus ossos saltavam do tecido fino e percebi que estava mais frágil que imaginava. Achei que fosse desmoronar na próxima rajada de vento.
Olhei pra baixo novamente e calculei no máximo três centímetros da ponta das minhas coturnos pra o final da grande rocha. Tentei calcular também a altura na qual eu me encontrava. Não consegui. Talvez porque fosse tão alto que eu não enxergava o final. Respirei fundo e senti o vento cortante penetrar meu nariz e boca, raspando com uma navalha uma pequena camada da minha sensibilidade.
A dor não diminuiu, eu apenas estava acostumada a conviver com ela. Ela era minha parceira de tantos longos anos. Chequei mentalmente se deixara o bilhete pro meu pai num local que ele visse. Dentro da geladeira, em cima do engradado de cervejas. Certeza que ele estava lendo agora, pois teria a grande final do seu time de futebol favorito e é lei assistir jogos com cervejas. Sorri novamente. Essa noite seria marcante pra ele.
Coloquei a mão na cintura e encarei novamente a infinita imensidão escura que me esperava. Ouvi passos. Gritos. Muitos gritos, mas eu não podia identificar o que eles queriam dizer. O vento era forte e alto, portanto não me deixava ouvir nada além de gritos sussurrados.
Os passos se aproximavam e os gritos também. Reconheci a voz. Era ele. Ele. Ele. Eu não pude acreditar, falei pra nunca mais vir atrás de mim e que isso seria a coisa certa a fazer. O único jeito de acabar com minha dor e fazer essa doença me matar de vez. Olhei pra trás e pude identificá-lo pela última vez. Gravei bem seu corpo escultural em minha mente, para levá-lo para a eternidade. Os braços extremamente musculosos e o peito desenhado à mão marcavam a blusa branca e molhada que ele vestia. Uma calça clara ensopada da chuva e tênis escuros. O cabelo curto, mas bagunçado. A voz. Me fez estremecer.
- NÃO FAZ ISSO.
Olhei pra frente e pulei. Senti cada centímetro do meu corpo enrijecer com a queda livre. Abri os braços e tive a sensação que sempre sonhei: voar. Era incrível. Pena que não durou muito.

16 de jan. de 2011

Algo de extrema inutilidade.


Venho por este, noticiar um fato de nula importância para a sociedade: não obtenho mais resultados em minhas tentativas de por pra fora tudo que sinto através de palavras.
As folhas permanecem em branco, quase do jeito que as encontrei. Se não fosse pelos pequenos amassados na ponta ou pelas inúmeras marcas das vezes que passei a borracha sobre rabiscos do lápis.
A inspiração não me habita mais. Essa fugiu, não deixou explicações ou substituição. Procuro-a em todas as partes. Todas. Vejo um pássaro voar. Liberdade. Jamais sentira isso, portanto não posso escrever a respeito. Duas pessoas felizes. Amor. Não me atrevo a falar sobre. Complexo demais. É preciso sentir para saber, e quem dirá que você realmente saberá?
Enfim, todos os fatos me levam a mesma conclusão: desaprendi a amar. Desaprendi a viver. Desaprendi a respirar. Desaprendi a escrever.
Enquanto isso procurarei outras formas de desabafar. Mas provavelmente não vou encontrar, porque a única coisa que sei fazer é escrever.
Quando na verdade eu não sei, apenas tento. Saber é entender, dominar, compreender etc.
Eu não sei de nada, não domino nem sequer minha personalidade. O que fazer se não escrever? Por que não tentar? Por que não errar? Por que não consigo mais?
Encontrarei a resposta escrevendo. E venho por este, noticiar um fato que continua sendo de nula importância para antes sociedade, agora para alguém: vou continuar tentando obter resultados em minhas tentativas de por pra fora tudo que sinto através de palavras.